O Ministério e a Unidade no Corpo de Cristo

“E a graça foi concedida a cada um de nós segundo a proporção do dom de Cristo.” (Efésios 4:7)

Qual é o seu ministério? Já encontrou a sua resposta?

Esta pergunta tem ecoado na mente de muitos cristãos e precisa ser respondida, porque ter um ministério é ter um propósito definido para a vida cristã. Cada membro do corpo de Cristo precisa encontrar seu ministério, ou seus múltiplos ministérios.

Efésios capítulo quatro é um convite à reflexão sobre a unidade do corpo de Cristo e o papel dos dons espirituais nesse contexto. O apóstolo Paulo, ao escrever aos efésios, destaca a importância de viver em unidade e como os dons espirituais são fundamentais para edificar a igreja.

Paulo inicia o capítulo quatro exortando os cristãos a viverem de maneira digna de sua vocação. Ele enfatiza a necessidade de manter a unidade do Espírito através do vínculo da paz. A igreja é chamada a ser uma só, com um único corpo e um único Espírito, igual ao Senhor que é um só (Efésios 4:4-6).

Essa unidade não significa uniformidade, mas sim harmonia. Os crentes são diferentes, com diversas funções e dons, mas todos são partes essenciais do mesmo corpo. A diversidade de dons é uma manifestação da graça de Deus, dada a cada um para que contribuam de maneira única para o corpo de Cristo.

Vocação e chamado universal

Um estudo do quarto capítulo da epístola aos Efésios vai nos ajudar nessa questão tão relevante. Antes de prosseguirmos, recomendo que você leia com atenção Efésios 4:1-16.

O primeiro verso apresenta um apelo do apóstolo Paulo para a igreja, a qual ele fala de uma vocação e de um chamado universal, portanto para todos os cristãos, o que inclui você. Isso significa que cada um de nós recebeu esse chamado. Você tem um chamado da parte de Deus e precisa atendê-lo para encontrar seu propósito como cristão.

Vocação é a tradução da palavra grega [κλεσεωσ] klesews – significando chamado, citação, apelo, convocação. Chamado é a palavra grega [εκλετετε] – ekletete do verbo [καλεω] kalew – chamar, convidar; e recebe influência de outro verbo [εκλεγω] eklegw – que significa eleger, selecionar, escolher.

O fato é que fomos chamados por Deus, convocados, selecionados e vocacionados pelo Espírito para ministrar ao mundo e à igreja mediante um ministério comum a todos os cristãos porque estamos falando de um ministério universal.

Então que ministério seria esse? O contexto mostra que Paulo está se referindo a um chamado para todos os cristãos e isso é confirmado pelas Escrituras em outras passagens (Rm 12 e 1Co 12, por exemplo). Nosso chamado está relacionado tanto a ministérios específicos resultantes dos dons espirituais que recebemos, como a ministérios ou funções universais, aquelas que são de responsabilidade de todos os filhos de Deus.

O apelo de Paulo é que andemos de modo digno desta vocação e deste chamado. Ou seja, se trata de algo vivencial em que aquele que ministra pode ter uma experiência pessoal com o objeto de sua ministração.

O propósito dos dons espirituais é triplo

Paulo menciona que Cristo, pela graça, concedeu dons aos homens, posteriormente enumerando alguns deles: apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres (Efésios 4:11). Ele destaca que esses dons são dados “com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de Cristo seja edificado” (Efésios 4:12).

1. Edificação do Corpo de Cristo: Os dons não são para benefício próprio, mas para o fortalecimento da igreja. Cada membro, ao operar em seu dom, contribui para o crescimento e maturidade do corpo.

2. Unidade da Fé: Ao utilizar seus dons, os crentes promovem uma maior unidade na fé e no conhecimento do Filho de Deus. Isso resulta em uma igreja mais coesa e alinhada com os propósitos divinos.

3. Crescimento em Maturidade: Paulo frisa a importância de “chegar à medida da plenitude de Cristo” (Efésios 4:13). Os dons são ferramentas para que cada membro do corpo atinja a maturidade espiritual, evitando que sejam “levados de um lado para outro por todo vento de doutrina” (Efésios 4:14).

A parábola dos talentos (Mt 25.14-30) nos adverte de que a dotação para este primeiro ministério não pode ser enterrada, ou fechará portas a outros dons e outros ministérios que viriam após este. Por esta razão, provavelmente, alguns se queixam de não possuírem certos dons espirituais ou um conjunto adequado de dons. Talvez, ainda não começaram a exercer o primeiro ministério para o qual todo cristão é chamado e por isso não receberão outra porção de dons do Espírito enquanto não explorarem a primeira.

Precisamos ser fiéis na prática de nossos ministérios universais para que possamos receber de Deus a capacitação para outros ministérios específicos baseados nos dons. Mas, qual seria este ministério?

O fruto do Espírito em ação

O segundo verso (Ef 4:2) traz à tona a ideia da manifestação do fruto do Espírito, mediante a atitude de humildade, mansidão e longanimidade. Aqui são citados apenas três exemplos de todo o arcabouço das manifestações do fruto do Espírito apresentado em Gálatas 5:22,23.

Uma verdade é que o fruto do Espírito precisa ser vivenciado no exercício de nossos ministérios para promover o ambiente adequado à manifestação dos dons espirituais.

Surge então a palavra suportando-vos [ανεχομενοι] anexomenoi – no sentido de tolerando. Seria o mesmo que estar junto (anexo), mesmo sob certo atrito ou dificuldade. No corpo de Cristo sempre haverá essa necessidade devido, obviamente, à natural diversidade promovida pelo Espírito Santo. Os membros diferentes precisam aprender a atuar juntos para cumprirem o propósito de Deus.

A mensagem aqui é que segundo o chamado de Deus para cada cristão, a manifestação do fruto do Espírito precisará ser vista. O fruto do Espírito se manifesta mediante a presença do Espírito Santo na vida do cristão. Ele precisa ser buscado para que Seu fruto se manifeste.

Todos os que são chamados para o desempenho de um ministério precisarão buscar a presença do Espírito Santo em sua vida para assim manifestar o fruto do Espírito, e suportar uns aos outros numa convivência “em amor”.

Falar de amor é muito complexo e difícil, embora alguns achem isso muito fácil. O amor bíblico de uns para com os outros é mais do que um sentimento romântico, é um grande desafio que se manifesta em atos concretos como o que veremos a seguir.

O apóstolo Pedro corroborando esse pensamento de Paulo afirma que existe um chamado para tolerar e perdoar injúrias de outros. Diz que o padecer injustamente agrada a Deus e que não há virtude nenhuma em pecando suportar as consequências com paciência.

“Pois que glória há, se, pecando e sendo esbofeteados por isso, o suportais com paciência? Se, entretanto, quando praticais o bem, sois igualmente afligidos e o suportais com paciência, isto é grato a Deus. Porquanto para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos.” (1Pe 2:19-21)

Outro ponto crucial abordado por Paulo é que o exercício dos dons deve ser feito em amor. Os dons espirituais, quando empregados com amor, promovem a verdade e o crescimento saudável do corpo. Esta é a “ligação perfeita”, onde cada parte ajustada e unida por si mesma contribui com amor, fortalecendo todo o corpo (Efésios 4:15-16).

Trabalhando duro pela unidade da igreja

O apelo do apóstolo feito no verso um: “andeis de modo digno da vocação a que fostes chamados” é aprofundado com a mensagem do verso três: “Esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz”.

A primeira palavra que aparece é esforçando-vos: [σπουδαζοντεσ] spoudazontes verbo particípio (imperfeito) do presente ativo nominativo masculino da segunda pessoa do plural. Seu infinitivo é [σπουδαζω] spoudazw significa fazer o melhor de si, sem poupar esforços, trabalho duro aplicando todos os esforços – “para preservar a unidade”.

Parabéns, você encontrou seu ministério universal no corpo de Cristo! O ministério da Reconciliação.

Este é o ministério de todos os crentes. O contexto mostra que a vocação e o chamado são para o ministério da reconciliação do qual Paulo fala em 2Co 5:18,19:

“Ora, tudo provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por meio de Cristo e nos deu o ministério da reconciliação, a saber, que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação”.

Não temo afirmar que este é o nosso primeiro ministério como cristãos, o ministério da reconciliação o ministério que promove a unidade no corpo de Cristo.

Este foi um ponto em que o apóstolo Paulo insistiu em várias de suas epístolas. Ele disse em Gálatas 3:28: “todos vós sois um em Cristo Jesus”; e em Romanos 12:5: “assim também nós, conquanto muitos, somos um só corpo em Cristo e membros uns dos outros”.

Estamos sendo fiéis despenseiros desta “multiforme graça”? Estamos aplicando todos os nossos esforços e trabalhando duro para dar um exemplo de vida, ministrando a palavra da reconciliação às pessoas com as quais nos relacionamos? Diligente esforço aplicado.

O texto ainda acrescenta a palavra diligentemente [τερειν] terein – que significa: com garra, firmeza. Esse é o nível de dedicação e zelo na busca da unidade que Deus espera daqueles que foram chamados para o ministério da reconciliação: esforço diligente na preservação da unidade do Espírito.

Unidade é uma palavra muito especial para a igreja de Deus porque também o é para Deus. Ele espera que sua igreja viva em unidade e foi por isso que Jesus orou: “Para que todos sejam um” (Jo 17:21). Essa unidade é contrária à natureza carnal, não é virtude humana intrínseca; é o resultado da ação do Espírito Santo na vida do crente; daí a necessidade de buscar o poder do Espírito Santo para vivenciá-la.

Unicamente esse poder é capaz de romper as muralhas de separação que erigimos entre nós e de nos manter unidos por vínculos de amor e de paz, capazes de suportar as tormentas que abalarão nossos relacionamentos. Paulo não considerava a doutrina e a prática como algo separado da fé. A teoria e sua aplicação estão entretecidas na trama da apresentação que Paulo faz do grande tema da unidade dos crentes.

O vínculo da paz. O texto diz: “preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz”. Vínculo é a palavra grega [συνδεσμω] sundesmw – algo que está junto, ligado, ligadura. Em Colossenses 2:19 a mesma palavra aparece novamente: “e não retendo a cabeça da qual todo o corpo, suprido e bem vinculado por suas juntas e ligamentos, cresce o crescimento que procede de Deus.”

Na tradução bíblica versão King James, em inglês, a frase final de Efésios 4:3 diz bond of peace. Bond ou band vem de uma raiz que significa ligadura, atadura, faixa. Daí surgiu o nome de um produto vendido no mundo todo com o nome de band-aid, algo que liga duas partes separadas por uma ferida, por um rasgo ou separação.

Você e eu fomos chamados para sermos elementos de ligamento e não elementos de separação. Nada estará tão distante do propósito de Deus para seus representantes na terra do que estarem separados, distantes uns dos outros por causa de alguma ferida ou lacuna. Nada negaria tanto esse chamado do que uma educada e tolerante convivência com esta situação.

Falando do antagonismo entre as obras da carne e o fruto do Espírito o apóstolo Paulo adverte em Gálatas 5.25: “Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito”.

O capítulo 4 de Efésios revela que a unidade do corpo de Cristo depende do uso correto e amoroso dos dons espirituais. Os crentes são chamados a celebrar suas diferenças, sabendo que todos têm um papel vital a desempenhar. Ao abraçarem seus dons e utilizá-los para edificação coletiva, caminham juntos em direção à maturidade espiritual.

Essa mensagem continua sendo relevante hoje. Em um mundo cada vez mais individualista, a igreja é lembrada de buscar a unidade através dos dons que Deus generosamente distribuiu, para que coletivamente reflitam a plenitude de Cristo ao mundo.

 

 


Referências:

  • i F. Wilbur Gingrich, Léxico do Novo Testamento Grego Português (São Paulo, SP: Edições Vida Nova, 1986), p.117.

  • ii Maria P. F. Moniatoglou, Dicionário Grego-Português Português-Grego (Porto, Portugal: Porto Editora, 2004), 276.

  • iii Bárbara e Timothy Friberg, O Novo Testamento Grego Analítico (São Paulo, SP: Edições Vida Nova, 1981), 594.

  • iv Comentário Bíblico Adventista em CD-ROM.

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